domingo, 29 de agosto de 2010

Jacaré

Nos papéis ainda só faço rabiscos, mas há quem escreva histórias. Uma das preferidas da mãe é esta que conto a seguir:
Uma vez um jacaré ouviu dizer que o elefante tinha uns belos dentes de marfim. Dois: grandes, ENORMES. Toda a gente falava dos dentes do elefante, assim pesados, recurvos, cobiçados pelos caçadores para com eles fazerem adornos para as mulheres usarem.
Então o jacaré, que era muito estúpido, mas muito convencido de si mesmo, fez um trejeito de desdém e disse para o passarinho que lhe viera com a notícia: "Ora, ora. Ele só tem dois dentes. E então eu, que tenho a boca cheia deles?" Claro que o passarinho se surpreendeu. "Mas de marfim? Não sabia..."
O jacaré ficou furioso. "Pois não. Não sabes tu nem sabe ninguém, porque eu não ando para aí a mostrá-los, como o elefante! Mas a partir de hoje vocês vão passar a vê-los e a admirá-los, ora essa!"
E vai daí, veio a nadar até à margem do rio, pôs meio corpo fora da água, espapaçado na areia, escancarou a bocarra e ali ficou a exibir a dentuça.

Passou um dia, passou uma semana, passou um mês, e ele sempre no mesmo sítio, imóvel e de boca aberta, todo orgulhoso da exibição que fazia. E como não queria que ninguém que por ali passasse perdesse o que ele julgava ser o maravilhoso espectáculo da sua bela dentadura, nunca mais fechou a boca, nem mesmo para comer. Até que acabou por morrer de fome. (Guilherme de Melo, Os Leões não Dormem Esta Noite)
Normalmente acaba de ler e depois fica calada, assim, a olhar para mim. E dá-me os lápis e uma folha, para eu fazer uma história. E eu com ar de quem acabou de ouvir a bula dos supositórios para a febre. É que gosto de ouvir, sim. Mas estas histórias complicadas... não percebo tudo. Acho piada e tal, quando ela diz ENOOORMES, mas não percebo aquele olhar sem dizer nada, típico de estou aqui a falar e tu não fazes a mínima ideia.
Nã, assim não gosto. Ao menos nos três porquinhos, normalmente há palhaçada.

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