sexta-feira, 11 de junho de 2010

Tambor

A mãe trabalha à noite. Quando o pai sai de casa de manhã, ela deita-se a dormir no chão do meu quarto enquanto eu estou a brincar. Deixa-me desarrumar tudo das caixas, espalhar os carros, tirar os livros dos caixotes... É um sossego.
Quando me farto, gosto de brincar com a barriga dela. Bato a fingir de tambor, espreito a fingir de microscópio, agito a fingir de gelatina e pico, não é a fingir de nada, mas para ela acordar, porque me farto das brincadeiras com facilidade.
Um dia destes a mãe estava a dizer para não sei quem que já tinha fechado a loja. Depois percebi que a loja era a barriga dela e o fecho aquele risquinho por baixo do umbigo. Agora quando me ponho a espreitar pelo buraquinho já sei que não há nenhum mano a crescer lá dentro. Não há nem vai haver. Nesta casa já só entram meninos crescidos, a andar, e é pela porta. Primeiro porque não há quartos para mais. E segundo porque a barriga da mãe é uma óptima bateria.
Ela faz ginástica para tentar perder a barriga. E põe muitos cremes para não parecer gelatina. Oxalá não resulte.
Sabem, no fundo, acho que ela queria aquela história da loja aberta. Na escola, à hora do lanche, às vezes topo-a a olhar para mim com ar de "Gostava que aquele ali fosse meu..."
E não é que sou?

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